segunda-feira, 19 de maio de 2008

drops literário #6

à caroll.

[...] Mas quem é esse: eu... Hor? Afinal, será que sou apenas um? Ou será que sou dois e tenho as vivências desse segundo? Sou muitos? E todos os outros que sou eu vivem lá fora, do outro lado daquela última parede exterior? E todos eles nada sabem sobre suas vivências, nem sobre suas recordações... e então elas não têm lugar neles, os que estão do lado de fora? Ah, mas elas permanecem com Hor, vivem a vida dele, assaltam-no sem nenhuma misericórdia. Elas confundem-se com ele, que as arrasta atrás de si como uma cauda que desliza, infinita, através das salas e dos quartos, sempre crescendo e crescendo.

Ou será que existe algo entre mim e vocês aí fora - seja um ou sejam muitos - algo que os torne unidos a mim, como as abelhas à rainha? Vocês me sentem, mebros de meu corpor espalhado? Estão escutando minhas palavras inaudíveis, ou já as escutaram em algum momento? Por ventura você procura por mim, meu outro? Por Hor, que é você mesmo? Por sua lembrança que está comigo? Por acaso nos aproximamos um do outro através dos aposentos infinitos, como estrelas, passo a passo, imagem por imagem?

E será que um dia nos encontraremos, hoje ou em qualquer tempo?

E o que seremos, então? Ou não seremos mais? Ou será que iremos nos anular um ao outro, como o "sim" e o "não"?

Mas uma coisa, então, você verá: eu conservei tudo fielmente.

Meu nome é Hor.


michael ende - o espelho no espelho

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