o melhor sono de ana acontecia sempre que o pai lhe cantava aquela cantiga de ninar. ana não entendia direito as palavras que estavam na canção, mas gostava muito da harmonia e da melodia que a voz do pai produzia. mas do que ana mais gostava era de ficar com o ouvido colado no peito do pai enquanto ele cantava.
o pai de ana a abraçava bem forte e cantava. em cada ouvido de ana havia uma canção: num deles, estava aquela que todo mundo ouvia; aquela que a mãe de ana ouvia do escritório, enquanto terminava de fazer a lição de casa do trabalho dela. no outro ouvido tinha uma canção particular, uma canção que só ana ouvia, porque estava com o ouvido colado no peito do pai.
nessa canção não tinha só letra e melodia e harmonia, não. nessa canção ana sentia a respiração do pai e as batidas do coração do pai e - se ana fechasse os olhos bem forte - conseguia até ver onde a voz do pai nascia.
a voz do pai de ana era bem grave e o peito dele vibrava quando ele cantava, fazendo cócegas no ouvido de ana. mas a gravidade da voz do pai só deixava ana com medo quando ele lhe dava uma bronca. quando cantava, a gravidade da voz do pai protegia ana, a deixava em paz... a voz do pai fazia - com o ouvido assim colado no peito dele - o melhor abraço do mundo.
depois de todas essas noites em que o pai lhe cantava a canção de ninar, ana aprendeu que o melhor abraço do mundo é esse abraço que o pai da gente dá quando canta pra gente dormir. e ana descobriu também, que o segredo desse abraço é a gente poder sentir o coração do outro bater, é a gente sentir a respiração do outro até conseguir respirar igual. dali em diante, ana decidiu que todos seus abraços seriam assim, porque é assim que um abraço tem que ser.
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